Em primeiro lugar, vamos traduzir. PKM significa Personal Knowledge Management, ou Gestão Pessoal do Conhecimento. Ela “consiste em métodos práticos para buscar sentido nos fluxos crescentes de informação que nos cercam.” Conforme explica Harold Jarche em seu blog.
Como você monta o seu ambiente pessoal de aprendizagem?
Ou seja, estamos falando na capacidade pessoal de ser atravessado por inúmeros fluxos de informação sem ser dilacerado por eles, mantendo em mente uma orientação pessoal singular, um projeto de vida, o desejo de absorver e produzir conhecimento.
Aqui temos um ponto muito interessante, porque a gestão pessoal do conhecimento não diz respeito somente ao modo como uma pessoa absorve conhecimento, mas também à sua capacidade de produzir e compartilhar. Na gestão pessoal do conhecimento, não pensamos apenas em nós mesmos, mas em nossa rede e em como podemos alimentá-la. Qual o conhecimento que somente eu poderia gerar e compartilhar com a minha rede?
Dessa forma, a gestão pessoal do conhecimento seria a base para a gestão social do conhecimento, facilitada e estruturalmente catalisada pelas ferramentas tecnológicas que hoje ativam nossas redes sociais.
Esse modo de ver a gestão do conhecimento é bastante inovador no contexto das organizações porque grande parte do que se tem produzido para orientar a gestão do conhecimento nesse contexto é baseado numa visão centralizada, da organização que precisa que o conhecimento seja padronizado, circule e chegue ao lugar certo. A discussão de PKM muda o sujeito dessa discussão. Coloca o indivíduo, suas escolhas e suas múltiplas redes no centro do jogo e passa a se conectar com temas tais como gestão de carreira, que até então não figuravam nas discussões de gestão do conhecimento.
Harold Jarche utiliza um modelo que chama de Seek, Sense and Share (ou busca, sentido e compartilhamento) para descrever como ele, pessoalmente faz sua gestão do conhecimento, mas admite: o processo de PKM é muito pessoal.
Pierre Levy fala em storytelling, ou seja, somos todos produtores de histórias conforme produzimos na rede ou trabalhando em rede. Stephen Downes e o grupo Internet Time Alliance falam em Personal Learning Environments, e trazem para a discussão os diversos modos dos indivíduos organizarem seus aprendizados, tendo em vista que estes não são apenas formais ( realizados em contexto escolar, dirigido, de salas de aula ou cursos online), mas também informais (baseados nas habilidades de conversação e nas redes em que cada um está envolvido).
Com o indivíduo no centro, volta a questão da diversidade. Existem inúmeros estilos de aprendizagem, só (Howard Gardner estipulou 8 deles) e cada um tem uma maneira distinta de absorver, processar e gerir seus aprendizados. Como estimular a gestão pessoal do conhecimento à luz dessa diversidade?
Fiquei com essa pergunta por alguns dias. Uma das possíveis respostas que ouvi na rede foi aquela que aponta para a importância de ensinar a definir interesses, categoriza-los e filtrar a informação a partir daí. Interessante, mas talvez um pouco estruturado demais para o meu estilo de aprendizagem pessoal, então segui com a pergunta.
Como estamos expostos a inúmeros fluxos, talvez o ambiente pessoal de aprendizagem (PLE) e a gestão pessoal do conhecimento (PKM) sejam de alguma forma emergentes, ou seja, definidos conforme o caos a que estamos expostos vai tomando forma. Talvez esses ambientes e os modos de gestão do conhecimento mudem tão dinamicamente quanto mudam as próprias redes de conhecimentos que construímos em torno de nós.
Foi então que me deparei com um quadro publicado em seu blog por Thierry de Baillon falando sobre as organizações complexas e o processo de aprendizado.
O autor introduz ali um conceito que me pareceu inspirador para pensar a importância da PKM: micro-fundações de capacidades dinâmicas que dão origem a práticas emergentes nas organizações. Essas micro-fundações, se opõem, por exemplo, às famosas best practices, que implicam uma visão muito mais estática e têm como pressuposto a existência de uma prática melhor. Talvez o indivíduo e consequentemente sua rede pessoal sejam a gênese dessas micro-fundações. Ali nasce um conhecimento relevante e totalmente aplicado ao trabalho, pois nasce da própria capacidade de gestão de um profissional que está exposto a uma grande diversidade de fluxos de informação e conhecimento.
Essa possibilidade pode nos inspirar a repensar as práticas de fomento ao aprendizado nas organizações. Não é somente uma questão de customização em massa (conforme apontou John Husband outro dia no Twitter), mas uma mudança fundamental da visão que a organização tem do indivíduo como “recurso” a ser “utilizado” da forma mais econômica possível. Para que ele seja a gênese de práticas emergentes, é preciso que tenha liberdade de se relacionar, se conectar e produzir. Assim como acontece com uma água-viva tirada do mar para a observação, o indivíduo retirado de suas redes (por firewalls corporativos, por exemplo) seca. Seu PLE fica restrito e diante disso perde-se grande parte da riqueza que ele teria a oferecer. O indivíduo também é emergência. A riqueza que existia quando ele foi contratado não se mantém se o seu ambiente pessoal de gestão do conhecimento for restringido ou, em outras palavras, se o relevo do seu território de rede for codificado pela organização.
Ontem mesmo no TEDx Vila Madá ouvi Lili trainee contar sua experiência com esse tipo de restrição. Sim, é mais um dilema que se agrava com a chegada da geração Y.
Não é fácil pensar a organização complexa com as necessidades de controle nascidas n´outras eras, mas talvez sejamos a geração das perguntas difíceis. Não há como controlar um profissional em sua PKM ou em seu ambiente pessoal de aprendizado. Mas para que? Talvez não seja necessário controlar nada, se cada profissional estiver realmente engejado no que faz.
Então fecho com Drummond:
Como vencer o oceano, se é livre a navegação, mas proibido fazer barcos?”
Por Luziata em 26/03/2010
Fonte: Blog Ideias para inovar