Por Beto do Valle*
Mesmo com toda a evolução nas práticas de administração, continuamos a falhar em um aspecto central: concentramos nossos esforços na gestão de “coisas” enquanto o que realmente faz diferença para o negócio e a organização são os ativos intangíveis, particularmente a capacidade de gestão do conhecimento e inovação.
Nas últimas décadas diversos estudos (e particularmente este da Ocean Tomo: Intangible Asset Market Value Study, vêm mostrando que os ativos intangíveis e o capital intelectual (fatores como conhecimento, marca, processos, reputação e capacidade de inovação) representam uma proporção muito maior do valor de mercado das empresas de maior sucesso do que seu capital físico e financeiro. Ou seja: instalações, equipamentos e patrimônio financeiro valem muito menos do que capital intelectual.
É uma contradição incrível que, mesmo com essa constatação, organizações privadas e públicas insistem em focar sua gestão naquilo que vale menos e gera menos valor. Seguem estruturadas em torno de atividades e processos centrados nos ativos tangíveis: matérias-primas, instalações e equipamentos, recursos físicos e financeiros. O que mais se aproxima da gestão de ativos intangíveis nas práticas vigentes são a gestão de “recursos humanos” (e temos aí o claro viés de tratar pessoas como “recursos”) e a gestão de marca. Mas mesmo esses processos são tratados como apoio ou como acessório ao negócio, que continua sendo gerenciado basicamente como fluxos de recursos e transações.
Os limites da gestão centrada em tangíveis
A visão do negócio como gestão de tangíveis é limitadora e insuficiente para lidar com o ambiente dinâmico e as relações complexas do mercado atual, que exige aprendizagem e adaptação contínuas, flexibilidade nas práticas e processos, competência para estabelecer e manter múltiplos relacionamentos em tempo real, e capacidade de inovação continuada. Nenhuma dessas exigências pode ser atendida sem que se trate a gestão de intangíveis como uma capacidade central do negócio, porém as organizações continuam atuando com modelos mentais e processos viciados na gestão tradicional de tangíveis.
Em post recente discuto brevemente as possíveis causas desse “apego”. Mas o fato é que esse modelo já se esgotou e ignora um mundo de oportunidades que emergem em nosso complexo ambiente social e de negócios.
Como integrar conhecimento e inovação ao negócio?
Mas como fazer da gestão do capital intelectual a dinâmica central do negócio? Não existe forma simplificada de se lidar com a complexidade. Mas as organizações mais inteligentes não esperam: buscam suas próprias soluções e evoluem constantemente.
Algumas definições iniciais com base nesse questionamento formam a base para se construir uma nova visão do negócio que integra a gestão do conhecimento e a inovação como processos centrais – pragmática o suficiente para gerar diferenciação e resultados no curto prazo, mas transformadora o suficiente para impulsionar a organização rumo ao futuro.
- Identificar as reais fontes de valor e de diferenciação do seu negócio – qual é realmente o seu negócio? Uma reflexão distanciada e provocativa pode levar a organização a enxergar seu negócio sob uma nova perspectiva, e a partir daí colocar a devida ênfase nos fatores que realmente fazem a diferença.
- Identificar o papel do conhecimento e da inovação no negócio e na organização – qual o papel do conhecimento em seu negócio? Manter funcionando instalações e equipamentos, ser o fator central para identificar o melhor ponto logístico, conceber as instalações mais adequadas e gerenciar os melhores equipamentos para viabilizar a inovação? Compreender o real papel do capital intelectual pode levar a organização a se reorganizar para extrair o máximo valor desses ativos.
- Avaliar as potenciais contribuições da gestão do conhecimento e inovação (GCI) para o negócio– como uma gestão mais consciente e efetiva do conhecimento e inovação pode alavancar o negócio no curto e no longo prazo? Onde o conhecimento fará mais diferença? É mais importante buscar pequenas inovações em produtos ou reinventar seu modelo de negócio? Definir a contribuição estratégica esperada é chave para a adoção de uma nova dinâmica para o negócio.
- Definir indicadores e processos de GCI a partir dos indicadores do negócio – que conhecimentos devem ser compartilhados de forma estruturada no processo produtivo para aumentar a produtividade em 20%? Que práticas de colaboração e inovação devem ser sistematizadas de forma a contribuir para o aumento de X% em nossa participação de mercado? Alguns casos emblemáticos mostram (confira) que, ao entender como o conhecimento pode contribuir para a geração de valor, é possível definir estratégias e indicadores orientados diretamente para esses resultados.
- Integrar processos de negócio e práticas de GCI – como evoluir das atuais práticas de gestão que ignoram ou desperdiçam o capital intelectual para uma dinâmica de gestão que integre o conhecimento e a inovação como forças centrais do negócio?
Desafiar-se a integrar a gestão do conhecimento e inovação ao negócio é provavelmente o mais rentável investimento em ativos intangíveis que sua organização pode fazer.
(*) Beto do Valle é fundador da Impakt Consultoria e liderou projetos em organizações como Alcoa, Braskem, CPFL, CTEEP, Delphi, EDP, Fundação Grupo Boticário, Fundação Telefonica Vivo, Fundap, Governo do Estado de São Paulo, Gerdau, Grupo ISA, Itaipu, Itaú, Light, ONS, Petrobras, Santander, Serasa Experian e Vale, entre outras.